quinta-feira, 29 de março de 2018

A Paixão de Jesus Cristo, nossa Consolação



Recogitate eum qui talem sustinuit a peccatoribus adversum semetipsum contradictionem, ut ne fatigemini, animis vestris deficientes – “Não deixeis de pensar naquele que dos pecadores suportou contra si uma tal contradição; para que não vos fatigueis, desfalecendo em vossos ânimos” (Hb 12, 3)
Sumário. O Senhor chama com razão a si todos aqueles que sofrem e gemem sob o peso das tribulações; porque neste vale de lágrimas ninguém nos pode consolar tanto como Jesus crucificado. Em todas as perseguições, calúnias, desprezos, enfermidades, misérias, especialmente em vendo-nos opressos pelos sofrimentos e abandonados por todos, lancemos um olhar sobre a cruz de Jesus, lembremo-nos do muito que Ele sofreu por nós, unamos os nossos sofrimentos aos de Jesus e teremos achado o remédio mais eficaz para todos os nossos males.
I. Neste vale de lágrimas, quem nos pode consolar melhor do que Jesus crucificado? Nos remorsos de consciência, suscitados pela lembrança de nossos pecados que poderá melhor suavizar as nossas angústias, do que a certeza de que Jesus Cristo se quis entregar à morte a fim de satisfazer pelas nossas culpas? Dedit semetipsum pro peccatis nostris — “(Jesus) se deu a si mesmo pelos nossos pecados” (1). Em todas as perseguições, calúnias, desprezos, privações de bens e dignidades que nos sobrevêm na nossa vida, quem nos poderá melhor fortalecer, para sofrermos com paciência e resignação, do que Jesus Cristo desprezado, caluniado e pobre, que morre numa cruz nu e abandonado por todos?
Quando estamos doentes, deitamo-nos numa cama bem arranjada; quando, porém, Jesus estava enfermo na cruz na qual morreu, não teve outro leito senão um rude lenho, em que foi pregado com três cravos; nem teve outro travesseiro senão a coroa de espinhos, que continuou a atormentá-lo até ao último suspiro. Quando estamos doentes, vemos o leito rodeado de parentes e amigos, que se compadecem de nós, e nos procuram distrair; Jesus morreu cercado de inimigos, que ainda na hora da sua agonia e da morte já próxima o injuriavam e escarneciam como a um malfeitor e sedutor.
Nada consola tanto um enfermo nas dores que sofre, especialmente quando na sua enfermidade se vê abandonado por todos os mais, como a vista de Jesus crucificado. Ah! O alívio maior que então pode experimentar um pobre enfermo, é unir os próprios sofrimentos aos de Jesus Cristo. — Ainda nas angústias mais acerbas da morte, tais como os assaltos do inferno, a vista dos pecados cometidos e as contas que em breve se terá que dar ao Juiz divino, a única consolação que pode haver um moribundo, já nas vascas da morte, é abraçar o Crucifixo e dizer: Meu Jesus e meu Redentor, Vós sois o meu amor e a minha esperança.
II. Toda a verdadeira consolação que podemos desejar, todas as graças que Deus nos concede, todas as luzes, inspirações, santos desejos, bons afetos, dor dos pecados, bons propósitos, amor de Deus, esperança do céu: todos estes bens são frutos e dons que nos veem da Paixão de Jesus Cristo. Pelo que São Boaventura nos anima dizendo que “aquele que se aplica a meditar com devoção na vida e paixão santíssima do Senhor, acha ali tudo de que precisa; e nada terá que buscar fora de Jesus”. E Santo Agostinho acrescenta que para obtermos graças celestes especiais vale mais uma só lágrima derramada em memória da Paixão do Senhor, do que uma peregrinação a Jerusalém e um ano de jejum a pão e água.
Mas quem mais ânimo nos inspira, é nosso divino Redentor: Venite ad me omnes, qui laboratis et onerati estis; et ego reficiam vos (2) — “Vinde a mim todos os que vos achais em sofrimentos e sobrecarregados; e eu vos aliviarei”. Meus queridos filhos, diz Jesus, vós que gemeis sob o peso das culpas próprias e sois combatidos pela concupiscência e corrupção do homem velho, ah! Não percais o ânimo. Chegai-vos à minha cruz, recorrei a mim e eu vos livrarei de todo o mal; persuadi-vos de que em nenhuma parte achareis remédio tão eficaz, como na meditação de minhas chagas.
Ó meu Jesus, que esperança me poderia restar, a mim, que tantas vezes Vos voltei as costas e mereci o inferno? Que esperança poderia ainda nutrir, de um dia, entre tantas virgens inocentes, entre tantos santos mártires, entre os apóstolos e serafins, ir gozar no céu de vossa bela face, se Vós, meu Salvador, não tivésseis morrido por mim? É a vossa Paixão que, apesar dos meus pecados, me faz esperar de um dia ir na companhia dos Santos e de vossa santíssima Mãe, cantar as vossas misericórdias, agradecer-Vos e amar-Vos para sempre no paraíso. Meu Jesus, assim espero. Misericordias Domini in aeternum cantabo (3) — “Eu cantarei eternamente as misericórdias do Senhor”.
— Ó Maria, Mãe de Deus, rogai a Jesus por mim.
Referências:
(1) Gl 1, 4
(2) Mt 11, 28
(3) Sl 88, 2

(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo III: Desde a Décima Segunda Semana depois de Pentecostes até o fim do ano eclesiástico. Friburgo: Herder & Cia, 1922, p. 329-331)

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