A PÉROLA PRECIOSA
Breves pensamentos sobre o Rosário meditado, para sacerdotes.
pelo
Padre Wendelin Meyer, O.F.M.
Tradução portuguesa por
Alberto Maria Kolb
3.º MISTÉRIO
RECEBEI O ESPÍRITO SANTO
Os sacerdotes têm deveres de Apóstolos; eles devem ensinar, sofrer, sacrificar, espalhar a igreja, fortificai-a e protegê-la contra um mundo inteiro. Isso eles só podem e unicamente com a força de Deus; por este motivo Cristo Nosso Senhor lhes enviou o Espírito Santo. Eles receberam a plenitude das graças; uma vida nova, forte, flamejante de amor, os abraçava todos. Com este Divino Espírito venceram e superaram o espírito do mundo. No milagre de Pentecostes, os mesmos dons, mais ou menos, reservou Deus Nosso Senhor para todos os Seus sacerdotes. Deus os introduz a uma estreitíssima união com o SS. Sacramento do Altar.
Diariamente formam um só espírito com Ele, até que em fim após alguns anos de santa vida recebem a plenitude do Espírito Divino. O Sacerdote pode dizer-se realmente participante da vinda do Espírito Santo sobre os Apóstolos: o espírito de sabedoria. do intelecto, do conselho, da fortaleza, da ciência, da piedade e do temor de Deus.
O Espírito de sabedoria:
Os antigos sábios de Roma e da Grécia eram celebridades mundiais; eram sem dúvida grandes homens que conheciam a vida profundamente. E contudo estavam escurecidas as suas vistas. Mais alto, muito mais alto estão as almas nas quais opera o Espírito de Deus. Diante de seus olhos cai a aparência. A essência das coisas, seu valor e sua futilidade lhes aparecem, toda a miséria deste mundo efêmeros e transitório jaz desmascarado a seus pés.
Náusea e nojo apoderam-se deles. Usam das criaturas como se não usassem delas; por isso abre-se diante deles o esplendor e toda a magnificência do Unigênito do Padre Eterno, cheio de graça e de verdade. A Essência de Deus, Sua beleza e Seu amor infinito penetra as suas almas como o sol matutino abrasa e aquece a vegetação.
As profundezas da Religião, suas inefáveis harmonias, os seus dogmas, firmes e inabaláveis, abrem-se diante deles. Contemplam então um novo mundo, escutam músicas suaves da celeste mansão.
E a alma então estreita seus braços, recebendo um doce amplexo: Deus e Sua santa religião, amando o primeiro e praticando a segunda. O único objeto dessa criatura é o Eterno, o Infinito — Deus.
Oh dom inefável, admirável nos corações dos ministros de Deus!
Não deve ser este dom propriedade nossa? Não é nosso sagrado dever abraçar com íntimo amor o Altíssimo?
Devemos ser homens mortos ao mundo e vivos só para Deus, homens que, acima de todos os trabalhos e deveres, procuram conseguir o fim único e principal, que é encher-se a si e o mundo inteiro do desejo e do amor das coisas divinas. Roguemos, rezemos para que nos seja dado achar esta sabedoria, porque, possuindo-a, possuímos a vida.
O dom do intelecto:.
Existe um duplo modo de conhecer: um desprende-se da luz natural da razão, o outro vem do céu. Este último é fruto da graça, aquele consequência do trabalho intelectual.
O conhecimento nascido da graça e provado por uma santa vida não é outro senão o dom do intelecto.
Quem o possui, conhece, segunda vez, o que já tinha conhecido, mas agora mais claro e profundamente, como coisa completamente nova.
Esta luz ilumina por vezes mui intimamente os segredos divinos e mistérios sagrados, incendiando então o coração. E como é uma luz divina, que não pressupõe grande talento, pode iluminar e arder para homens mui simples e rústicos. A história e a vida dos Santos nos apresentam a este respeito esclarecimentos em abundância.
Não é isso uma consolação para nós, Sacerdotes? Vivamos sempre bem interiormente, cônscios do nosso próprio nada, e assim o Espírito de Deus estará lançando Sua sombra protetora sobre nós e entraremos deste modo no mundo místico de nossa santa fé.
Tomando então a palavra para falar em público, falaremos como quem tem poder que vem do céu e conduz ao céu. A palavra que pronunciamos é mui simples, mas arrasta após si as almas. E nós mesmos descansamos com gosto, possuindo o dom do intelecto, a nossa vida na contemplação das cousas divinas.
O dom de conselho:
Quem necessita mais este dom do que o sacerdote?
O sacerdote está em lugar daquele que Isaías chamava: «Consiliarius». O mundo bem o sabe, procura porém uma doutrina, que não é dada da carne e do sangue nem do fruto de trabalhoso e fatigante pensar. O mundo quer mais, deseja uma palavra que soa quase como foi a revelação, que clara e abertamente, com firmeza se desprende da alma fervorosa, de um interior que está intimamente unido com Deus Nosso Senhor. Isso só poderá dar aos homens aquele espírito plenamente ligado com o espírito de Deus e formando quase uma coisa só; poderá dar só aquele que conhece e ouve a voz maravilhosa de seu Deus habitando nele.
Quão pouco de sobrenatural perpassa as horas de nosso recreio, se só e unicamente nos fitamos nos nossos dotes naturais! Isso não deve ser assim.
Deste modo jamais saberemos dizer a palavra conveniente e adequada às almas interiores e profundamente pensativas. Tais almas existem muito mais abundantes do que pensamos; muitas vezes acham-se ajoelhadas ao nosso lado, sem as percebermos. Não foram por nós satisfeitas; retiraram-se visto que não éramos bastante aptos a contentá-las e nossas palavras passaram simplesmente pela superfície.
O dom da fortaleza:
Não é difícil ver e conhecer a beleza da religião cristã; ela brilha por entre as páginas do Evangelho. É fácil descansar-se entre doces meditações de princípios cristãos — católicos, mas traduzi-los na prática da vida, e até nas últimas consequências, isso requer força de ânimo e fortaleza. Pode por acaso viver um bom sacerdote praticando até á ultima perfeição; as suas obrigações, sem esta fortaleza especial?
Nunca; jamais! Ser sacerdote, isto é, sofrer e trabalhar com Cristo Jesus, é um dever que requer força, é uma obrigação que exige fortaleza.
Isso Deus bem o sabia, por isso nos deu o espírito da fortaleza. Esta força sobrenatural por si só é bastante poderosa para elevar os sacerdotes num santo idealismo sobre si mesmos, inspirá-los e deixá-los praticar feitos e que são, intimamente vistos, sacrifícios inauditos, heroísmos sem rivais.
O Espírito de Deus é força.
Onde este espírito vive e age, crescei e florescem almas generosas e fortes. Do interior destas almas brota e jorra um poder sobrenatural, invadindo todo o íntimo do homem, impelindo-o ao martírio de sua vocação.
O veni sancte Spiritus, da robur, fer auxílium!
O dom da ciência!
A religião católica é um tecido admirável. Seus fios correm da eternidade para o tempo, do tempo para a eternidade.
O Espírito elevado de Deus, os altíssimos pensamentos do Pai, do Filho e do Espírito estão nele contidos.
Grandes mentalidades não chegam, com uma vida ainda que mui prolongada, a compreender as profundezas dos ensinamentos de Cristo Nosso Senhor, menos ainda, comunicá-los e ensinai-os a outrem. A ciência humana poderá conseguir isto?
Pode investigar muita coisa, mas só quando o homem científico permanece imóvel, chegado ao seu termo, aí então começa a compreender e contemplar e mirar a alma iluminada por Deus. Almas que possuem o dom da ciência, vêm montes e vales que se escondem aos olhos dos maiores sábios. Tais favorecidos frequentaram as escolas do Espírito Santo. E é por isso que estas almas podem falar tão simples, tão claro e contudo tão profundamente que se fica admirado e estupefato.
Isso nos dá que pensar, Sacerdotes devem transmitir a ciência da salvação. Poderão eles cumprir perfeitamente esta obrigação sem o dom da ciência? Sem isso, não serão seus sermões e suas conferências, na maior parte, o fruto de estudos e perscrutamentos humanos?
Certo que devemos usar das nossas faculdades intelectuais, quanto mais, tanto melhor. Sobre todo trabalho humano, porém, estão, a lógica e a retórica do Espírito Santo. Este fala mui simplesmente, tão claro e ao mesmo tempo com tanta erudição e profundeza, que já crianças, já adultos podem seguir facilmente.
O sermão então é cheio de luz e repleto de unção e sente-se que outro fala pelo sacerdote. Oh preciosíssimo e inestimável dom.
O dom da piedade!
Existe um piedoso estado d’alma que não requer sentimentos forçados, mas eleva-se mansa e tranquilamente do interior, como o odor evapora-se da flor. Este estado se encontra, quando se lêem os escritos dos Santos, repletos de unção e de vida. Neles circula um espírito que não é deste mundo. Todas as palavras são quase como ligadas por suspiros. O leitor vê uma alma que não abraça o pecado por todos os tesouros deste mundo, que prefere o comércio íntimo com Deus a todos os prazeres e todas as riquezas desta terra, que com sumo gosto se oculta para fruir de Deus, na oração e contemplação, que de sua vida faz um perpétuo culto ao Deus Uno e Trino, que sobremodo lê com amor no jardim encantador da Sagrada Escritura, enfim uma alma que vive totalmente em Deus e de Deus Uno e Trino, que sobremodo lê com amor escritos místicos de S. Boaventura e não percebe o sopro deste dom da piedade?
Porém é um mero perceber que sentimos. E nós somos sacerdotes, homens que desejam levar e converter o mundo à piedade? Todo nosso exterior devia indicar devoção, tal qual a revelam os escritos dos Santos. É esse nosso caso? Superiores — diz São Boaventura «devemos estar tão cheios de fervor, de devoção e piedade que sem impulso de fora, pratiquemos fielmente todas as virtudes que são segundo as circunstâncias e situação, em que nos achamos a melhor e mais proveitosa.» (De sex alis Seraph. 1-3), Pedi e recebereis! (S. João, 16-24).
O dom do temor de Deus!
«Beatus vir, qui timet Dóminum...» (Ps. I 111-1), assim orou e cantou o piedoso levita desde séculos, imemoriais.
O Espírito de Deus foi seu Mestre, ensinando-o. «Bem aventurado», diz ele, pois a bem-aventurança está no temor de Deus. Entretanto a grande maioria da humanidade não conhecerá nunca está bem-aventurança; muitos vivem no temor servil. Eles vêm atrás dos espinhos dos dez mandamentos Jeová, isto é, Deus Nosso Senhor, com o azorrague; mas que nosso divino e meigo Redentor está também escondido debaixo das leis e detrás dos mandamentos, o Salvador, cujo amor não tem medidas nem limites, isto bem poucos vêem e compreendem. Aqueles porém que o compreendem, fogem do pecado e evitam a transgressão da lei, porque Deus é essencialmente bom e perfeito. Evitam arte toda sombra de pecado e imperfeição, porque estão persuadidos e compenetrados da infinita bondade paternal de Deus. Eis as almas, nas quais habita e mora o dom do temor de Deus.
Também em nós vive este dom, mas pensamos em aumentá-lo?
Que penetrantes e persuasivos seriam, os nossos sermões e as nossas palavras sobre o pecado, se possuíssemos a plenitude deste Divino Espírito! Como trabalharíamos contra o pecado, si fossemos dele inimigos acérrimos! Nossa atividade no confessionário, no tribunal da penitência, tomaria então certamente outro caráter.
O Ego te absolvo é o primeiro e principal efeito do sacramento da penitência, mas também o Ego te erudio, isto é, a educação do penitente para o santo temor não só dos pecados mortais, mas até dos veniais e de todas as imperfeições, tem grande valor. Estes são os dois pólos, os dois extremos de verdadeiro trabalho no santo tribunal da penitência.
Nós sacerdotes devemos educar as almas, tomar-lhes o temor servil e em lugar deste implantar-lhes um amor filial para com Deus Nosso Senhor.
Roguemos incessantemente que também cresça este tão precioso dom.
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