Quid prodest homini, si mundum universum lucretur, animae vero suae detrimentum patiatur? – “Que aproveita ao homem ganhar o mundo inteiro, se vier a perder a sua alma?” (Mt 16, 26)
Sumário. Eis aí o negócio de todos os negócios, o único importante, o único necessário: o serviço de Deus e a salvação da alma. Quem se salvar, será feliz para sempre e gozará no céu toda a sorte de bens; ao contrário, quem se condenar, será para sempre desgraçado e sofrerá no inferno toda a sorte de males. Mas, como é que este tão importante negócio é tão descuidado da maior parte dos homens?… Ah, meu irmão não sejamos nós do número desses insensatos e não imaginemos que possamos fazer acordar o céu com os pecados.
I. Contempla, meu irmão, de quão grande importância é para ti o conseguires teu último fim. É de uma importância suprema; pois que, se o alcançares e te salvares, serás feliz para sempre, gozarás na alma e no corpo toda a sorte de bens; se, porém, o errares, perderás a alma e o corpo, o céu e Deus; serás eternamente infeliz e condenado para sempre. É este, portanto, o negócio entre todos os negócios, o único importante, o único necessário: Servir a Deus e salvar a alma.
Portanto, meu irmão, não digas mais:
“Por enquanto quero viver para minhas satisfações; mais tarde me darei a Deus e assim espero salvar-me.”
Quantos não foram levados ao inferno por esta falsa esperança! Eles também falavam assim e agora foram condenados e não há mais remédio para eles. – Qual o condenado que se quis condenar? Deus, porém, amaldiçoa ao que peca com a esperança do perdão: Maledictus homo qui peccat in spe. Tu dizes: quero cometer este pecado e depois o confessarei. Mas quem sabe se haverá tempo: quem te garante que não hás de morrer logo depois do pecado? Tu perdes a graça de Deus; e que será se não a puderes mais adquirir? Deus usa de misericórdia com aquele que o teme, não com aquele que o despreza: Et misericórdia eius timentibus eum (1) – “Sua misericórdia é par aos que o temem”.
Não digas mais: com igual facilidade confesso dois pecados como três; não, porque Deus te perdoará dois pecados e não três. Deus suporta, mas não suporta sempre: ut in plenitudine peccatorum puniat (2) – “Afim de castigar na plenitude dos pecados”. Quando estiver cheia a medida, Deus não perdoa mais e castiga ou com a morte, ou com o abandono do pecador, de modo que, ruindo de pecado em pecado, se precipita no inferno. Tal abandono é castigo pior do que a morte.
– Meu irmão, repara bem no que estás lendo. Põe um termo à vida de pecado e consagra-te a Deus, receia que não seja agora o último aviso que Deus te dá. Basta de ofensas; basta de tolerância da parte de Deus. Teme que depois de mais um pecado mortal, Deus talvez não queira mais perdoar-te. Olha, que se trata da alma, que se trata da eternidade.
Este grande pensamento da eternidade – a quantos não fez desapegar-se do mundo, a quantos não fez irem viver num claustro, num deserto ou numa gruta!
II. Considera que o negócio da salvação eterna é o mais descuidado. Pensa-se em todas as coisas, exceto na salvação. Há tempo para tudo, exceto para Deus. Aconselhe-se a uma pessoa mundana que frequente os sacramentos, que faça cada dia meia hora de oração. Responde: Tenho filhos, tenho sobrinhos, tenho propriedades, tenho negócios a tratar. Ó céus! E não tens uma alma? Pois, chama tuas riquezas, chama teus filhos ou sobrinhos para virem em teu auxílio na hora da morte e te livrarem do inferno, se vieres a condenar-te.
Não imagines que possas fazer ir de acordo Deus e o mundo, o céu e os pecados. A salvação não é um negócio que se possa tratar por alto; mister é que te faças violência, mister é que empenhes todas as tuas forças, se quiseres ganhar a coroa imortal. Quantos cristãos se iludiram com a ideia de que mais tarde serviriam a Deus e se salvariam e agora estão no inferno! Que loucura, pensar sempre no que passa tão breve e pensar tão pouco no que nunca terá fim!
Ah! Meu irmão, não sejas do número daqueles insensatos. Se no passado te descuidaste da salvação, começa ao menos agora a pensar seriamente em tua sorte e dize a ti mesmo: tenho uma alma só; se a perder, terei perdido tudo. Tenho uma alma só; se à custa desta minha alma ganhasse o mundo, de que me serviria? Se me tornar uma celebridade, mas perder minha alma, de que me aproveitara? Se amontoar riquezas e engrandecer minhas casa, mas perder a alma, que proveito tirarei? De que serviram as grandezas, os prazeres, as vaidades a tantos que viveram neste mundo e agora ficaram reduzidos a pó numa cova, enquanto sua alma foi relegada ao fundo do inferno? – Se, pois, a alma é minha, se tenho uma alma só, se, perdendo-a uma vez, perco-a para sempre, devo pensar bem seriamente em minha salvação. Este negócio é supremamente importante. Trata-se de ser ou sempre feliz ou sempre infeliz.
Ó meu Deus, confesso, para minha confusão, que até agora fui cego e errei longe de Vos; não pensei em salvar a minha única alma. Ó Pai celestial, salvai-me, pelos méritos de Jesus Cristo: ficarei satisfeito perdendo todas as coisas, contanto que não Vos perca, ó Deus meu! – Maria, minha esperança, salvai-me pela vossa intercessão.
Referências:
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(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 288-290)
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