Estes justamente são os meios que o anjo insinuou a Sto. Arsênio, quando lhe disse: Se queres te salvar, retira-te à solidão, observa o silêncio, e descansa em Deus, andando sempre na sua presença. De cada um destes meios falaremos aqui distintamente.
1. Do silêncio.
Primeiramente, o silêncio é um grande meio para nos ajudar a sermos almas de oração, e nos dispor para tratarmos continuamente com Deus. É difícil achar uma pessoa espiritual, que fale muito. Todas as almas de oração amam o silêncio, o qual se chama guarda da inocência, defesa contra as tentações e fonte da oração; porque, no silêncio, conserva-se a devoção, e nele povoam o nosso espírito os bons pensamentos. S. Bernardo diz que o silêncio e a calma forçam, de certo modo, a alma a pensar em Deus e nos bens eternos. Por isso, os santos buscavam os montes, as grutas e os desertos, para acharem este silêncio, fugindo do tumulto do mundo, onde não se acha Deus, como foi mostrado a Elias. O monge Teodósio guardou o silêncio durante trinta e cinco anos; e S. João Silenciario, bispo feito monge, o observou por quarenta e sete anos, até a morte. Todos os santos, mesmo os que não foram solitários, amaram o silêncio.
Oh quantos bens traz consigo o silêncio! É ele que cultiva a justiça nas almas, disse o profeta. Com efeito, de um lado nos preserva de muitos pecados, impedindo as disputas, as maledicências, os ressentimentos, as curiosidades; e de outro nos faz adquirir muitas virtudes. Como pratica bem a mortificação a outro que se abstém de falar, reprimindo o desejo de contar um fato ou dizer uma graça que viria a propósito na conversação! Como exercita bem a doçura aquele outro que ouve as repreensões e injúrias, sem responder coisa alguma! É por isso que o mesmo profeta diz ainda: Vossa força estará no silêncio e na esperança. — Com o silêncio evitaremos as ocasiões de pecar, e pela esperança obteremos as graças divinas para vivermos bem.
Ao contrário, falando demais, sofreremos imensos prejuízos. Primeiramente, assim como com o silêncio conserva-se a devoção, assim também se perde com o falar demais. Por mais recolhida que tenha estado uma alma na oração, logo se achará distraída e dissipada como se não a tivesse feito, se depois dela se põe a falar demais. Quando se abre a boca de um forno quente, o calor se evapora logo. — S. Doroteu dá este aviso: Evitai a loquacidade, porque ela expulsa do espírito os bons pensamentos e o recolhimento com Deus.
É uma regra certa que a pessoa que fala muito com os homens, pouco fala com Deus; e o Senhor por sua vez pouco lhe falará, porque está escrito que quando quer conversar com uma alma a conduz à solidão. — Quando pois a alma quiser ouvir a voz de Deus, deve buscar a solidão. Se nos calarmos, acharemos a solidão, dizia a venerável Margarida da Cruz.
O Espírito Santo nos adverte além disso, que no falar muito não deixará de haver algum pecado. Enquanto fala e prolonga a conversa sem necessidade, aquela talvez pense que não cometeu nenhum defeito; mas, se depois se examinar bem, não deixará de achar alguma falta de murmuração, de imodéstia ou de curiosidade, ou ao menos algumas palavras supérfluas.
Quando falamos muito, ordinariamente cometemos mil defeitos. A língua é chamada por S. Tiago um mal universal. — E assim é, porque, como adverte um douto autor, a maior parte dos pecados provém do falar ou ter ouvido falar.
Eis a excelente regra dada por S. João Crisóstomo: Deve-se falar somente quando é mais útil falar do que calar. — Dai este conselho: Ou calai-vos ou dizei coisas melhores do que o silêncio. — Feliz aquele que, na hora da morte, pode dizer com o abade Pambo, que como refere o Padre Rodrigues, não se lembrava de ter proferido uma palavra que depois tivesse necessidade de se arrepender de ter dito. Ao invés, Sto. Arsênio dizia que muitas vezes se tinha arrependido de ter falado e nunca de ter calado. Por isso Sto. Efrem dava este aviso aos seus religiosos: Falai muito com Deus, e pouco com os homens. — O mesmo dizia Sta. Maria Madalena de Pazzi: Uma verdadeira serva de Jesus Cristo suporta tudo, trabalho muito e fala pouco.
Quando houverdes de falar, tende sempre cuidado de pesar o que ides dizer segundo este aviso de Espírito Santo: Faze uma balança para pesar as vossas palavras antes de proferí-las. — Por isso dizia S. Bernardo: Antes que as palavras cheguem à língua, passem duas vezes pela lima do exame, afim de que se cale o que não convém falar. — Isto explicava S. Francisco de Sales em outros termos, dizendo que, para falar sem defeito, seria preciso que cada um tivesse a boca fechada com botões; de modo que, devendo abri-la para falar, pensasse bem naquilo que haveria de dizer.
Quando, pois, houverdes de falar, considerai bem o seguinte:
1.º - A coisa que quereis dizer, para ver se não ofende a caridade, a modéstia ou a observância.
2.º - O fim pelo qual falais, porque, às vezes, alguns dizem coisas boas, mas com fim menos reto, como parecerem espirituais, ou passarem por pessoas engenhosas.
3.º - A quem falais: Se é aos vossos superiores, aos iguais, ou às inferiores, se é em presença de pessoas seculares, ou das educandas, que talvez possam escandalizar-se com o que dizeis.
4.º - O lugar em que falais: Se é no coro, na sacristia, nos corredores, etc.
5.º - A maneira com que deveis falar: com simplicidade, sem afetação; com humildade, evitando toda palavra soberba ou de vanglória; com doçura, sem nada dizer com impaciência ou ofensa do próximo; com moderação, não sendo o primeiro a responder em qualquer coisa que se proponha, principalmente se fordes o mais novo de todos; com modéstia, não interrompendo a que está falando. Demais, guardai-vos de qualquer palavra que cheire o mundo; evitai os risos imoderados; nem façais gestos inconvenientes.
Quem fala pouco de Jesus Cristo, dá sinal de que o ama pouco. Dizia Sta. Teresa: Nas conversações dos servos de Deus está sempre presente Jesus Cristo. — Disto exatamente nos refere um singular exemplo do Padre Gisolfo, pio operário, na vida do venerável Padre Antônio de Colellis. Diz ele que o Padre Constantino Rossi, mestre dos noviços, viu um dia entreterem-se juntos dois daqueles, que mais tarde foram os Padres Antonio de Torres e Filippe Orilia; e notou no meio deles um outro jovem de aspecto belíssimo. Admirou-se o mestre de ver que os dois jovens, tidos por ele por exemplares, conversavam com um forasteiro sem licença; e perguntou-lhes depois quem era aquele jovem que vira a discorrer com eles. Os noviços lhe responderam que não estivera com eles ninguém de fora. Ouvindo, porém, o mestre que, na ocasião, estavam falando de Jesus Cristo, compreendeu que era o mesmo divino Salvador que se tinha deixado ver entre eles.
Lê-se nas crônicas da reforma de Sta. Teresa, que uma religiosa carmelita descalça dizia: É melhor falar com Deus, do que falar de Deus.
Retirado do Livro: A Verdadeira Esposa de Cristo, por Santo Afonso de Ligório.
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