Aceitas em um espírito de fé e acolhida das graças atuais, estas experiências dolorosas levam os esposos a perceber que o “julgo do Salvador é doce e seu fardo é leve”. (Mt 11, 30)
Fonte: La Porte Latine – Tradução: Dominus Est
O apoio mútuo no casamento é uma das mais belas realizações da caridade fraterna descrita por São Paulo ao longo de suas epístolas. Conhecedor dos diversos destinos, seja de ordem natural ou de ordem sobrenatural, tanto das alegrias quanto dos sofrimentos, ele encontra uma aplicação particular quando o sofrimento comum se refere ao fim original do matrimônio (procriação e educação dos filhos), seja pela esterilidade, seja pela malformação, seja, enfim, pela morte de uma criança de tenra idade. No espírito de fé e acolhida das graças atuais concedidas, os lares atingidos por uma ou outra destas três provações sentirão que “o julgo do Salvador é doce e seu fardo é leve” (Mt 11, 30). É a esta dupla percepção que o presente artigo deseja contribuir.
Aqui, a nossa abordagem da esterilidade não será, evidentemente, médica, mas teológica e espiritual.
Hoje, os maiores afastamentos em relação à moral são vistos mesmo entre os batizados. Sem falar do aborto decidido depois que uma anomalia fetal grave foi identificada, deploram, por exemplo, que algumas pessoas casadas na Igreja se separem porque não conseguem conceber e vão tentar a sorte em outro lugar.
A história da procriação técnica assistida, desde o primeiro bebê de proveta de 1977 até esta mulher de 66 anos que engravidou em 2005 de seu primeiro filho por meio da doação de esperma e óvulos, é aterrorizante. Remetemos nosso leitor ao artigo bem documentado sobre este assunto pelo padre François Knittel, publicado no número 59 do Sel de la terre. De forma breve, digamos que as soluções ofertadas aos esposos pela medicina moderna para fugir da esterilidade são, em geral, inaceitáveis, pois contrárias à ordem natural e gravemente opostas à moral cristã.
SEM DIREITO À CRIANÇA
Logo, não é inútil recordar claramente que o casamento não é um direito à criança, nem um direito à criança sem malformação.
O objeto do contrato matrimonial não pode ser a criança, visto que ela ainda não existe. Qual é o seu objeto?
“É o direito de cumprir os atos naturais capazes de engendrar uma nova vida, e destinados a isso”(1).
Outrossim, no caso de dificuldade para levar a termo o ato conjugal, é possível aos esposos utilizar métodos que ajudem a realização natural deste ato. Por outro lado, jamais é permitido utilizar uma técnica médica que substituiria o ato natural, como uma fecundação in vitro, mesmo a partir de gametas que provenham dos esposos legítimos. Este é o ensinamento do Papa Pio XII, no discurso citado abaixo:
“Em relação à fecundação artificial, não somente ocorre um extremo reverso, mas é necessário afastá-lo absolutamente. Falando assim, não se proscreve necessariamente o emprego de certos métodos artificiais destinados unicamente ou a facilitar o ato natural, ou a levar o ato natural realizado a atingir o seu fim.” Pio XII
Estabelecido este quadro moral, é claro que a esterilidade temporária, a fortiori a definitiva, é uma das maiores provações no casamento. O papel do sacerdote é encorajar aqueles que sofrem com ela. Ele os exortará a carregá-la como uma cruz decorrente do pecado de Adão, que perturbou o funcionamento inicial das coisas, e a se abandonar na providência deste Deus, Mestre da vida. Ele os encorajará à esperança e à paciência. Conhecemos um lar que esperou quatorze anos por seu primeiro filho, logo seguido de dois irmãos. Outro lar só conseguiu ter o seu segundo filho dez anos após o primeiro.
Em todo caso, a infertilidade de um cônjuge – seja do esposo que não pode fecundar, seja da esposa que não pode sê-lo – não pode justificar nenhum amargor nem recriminação com o outro. “Dois em uma só carne”, os esposos infelizes formam uma única família infecunda, e carregam juntos, corajosamente, a provação comum.
PARENTESCO ESPIRITUAL ESTENDIDO
Além do mais, eles devem evitar se encolherem em si mesmos e se fecharem em uma forma de egoísmo a dois. Pelo contrário, eles são chamados a um parentesco estendido na Igreja. O tempo que teriam passado criando seus próprios filhos, se tivessem tido, lhes é deixado pelo Céu na intenção de se devotarem generosamente às obras de misericórdia e de apostolado, ou ao serviço do bem comum político. Os recursos financeiros dos quais eles dispõem encontram uma utilização bem apropriada na ajuda fornecida às instituições de educação.
A segunda provação particular que queremos considerar é a da malformação congenital. O fruto da procriação também é influenciado pelo pecado original. Quando as pessoas se casam, elas aceitam a possibilidade de engendrar um filho deficiente fisicamente ou mentalmente.
O livro Une expérience familiale (publicado nas edições Clovis) narra a vida de uma família de sete filhos, dos quais três possuem síndrome de Down. Ele foi escrito pelos pais das crianças.
Ele deveria estar nas mãos de todos os jovens esposos. Sua leitura não pode deixar de edificar e encorajar, se necessário for, a viver cristãmente uma experiência semelhante. Citemos o prefácio:
“Não ignoramos que a doença vem do pecado original. Temos certeza de que a doença foi querida por Deus, por vontade permissiva, para que sua glória desabroche de um modo ou de outro, como, por exemplo, através da cura milagrosa do cego de nascença narrada no Evangelho. Sabemos também que a doença perdura no mundo para que a caridade dos dotados de saúde encontre um meio de ser exercida e obter méritos. Nosso Senhor não anunciou que “sempre teremos pobres em nosso meio” (Mt 26, 11) que solicitarão a nossa assistência?”
Os esposos que conceberam um filho, apesar deles, deficiente, colaborarão para criá-lo cristãmente e assegurar a sua felicidade em tudo que depender deles.
Acrescentamos que, se acontecer de se descobrir qual dos dois pais está na origem da enfermidade congenital, e, a supor que não tenha havido dolo da parte deste, o outro que lhe recriminasse por isso faltaria contra a justiça e a caridade, pois a responsabilidade de uma concepção é sempre compartilhada em partes iguais.
Enfim, abordamos o caso humanamente dilacerante da morte dos filhos em tenra idade. Abordamos isto cristãmente, no espírito da Sagrada Escritura e da liturgia do sepultamento das criancinhas.
É a narração do massacre das criancinhas de Belém e de seus entornos perpetrado por Herodes (Mt 2, 18) que nos esclarece aqui. É muito importante notar que sua expressão de grande dor é envolvida na atmosfera da vida eterna. Por um lado, as crianças mortas por Herodes são os Santos Inocentes, cujo nascimento à vida bem-aventurada é celebrado liturgicamente em 28 de dezembro. Por outro lado, a vida do Salvador é preservada, visto que, sob alerta divino, ele é conduzido ao Egito por São José.
UM ELEITO NO CÉU
Por sua vez, a liturgia do sepultamento das criancinhas batizadas traz aos pais mergulhados na dor a melhor e mais verdadeira das consolações, aquela fundamentada sobre a fé teologal. Nesta cerimônia, a Igreja não pretende nada de fúnebre nem triste. Ela deseja que os sinos ressoem alegremente, como num dia de festa, e que os ornamentos de seus ministros sejam da cor da alegria e da luz, o branco.
Eis um trecho da oração recitada antes da partida ao cemitério:
“Acordais prontamente e sem merecimento próprio, Deus onipotente e cheio de bondade, a vida eterna a todas as criancinhas renascidas na fonte do batismo que deixarem este mundo, assim como cremos que fizestes hoje pela alma deste pequeno menino (desta pequena menina)”.
O fim último do matrimônio é povoar o céu de eleitos. Logo, é a sua maior ou menor realização que mede o sucesso de um matrimônio.
Em uma missa de sepultamento de uma criança batizada morta uma hora após o seu nascimento, o pregador acertou ao começar o seu sermão por estas palavras:
“Caríssimos pais, que nos reunistes nesta capela em torno do féretro de vosso filho, o vosso casamento já deu sinais de seu sucesso, pois acabastes de fornecer ao céu um novo eleito”.
É por tais palavras que os esposos poderão, na dor, “consolar-se mutuamente” (I Tm 4, 17).
Pe. Jean-Paul André, FSSPX
(1) Pio XII, Discurso ao segundo Congresso mundial da fertilidade e da esterilidade, 19 de maio de 1956.
Nenhum comentário:
Postar um comentário