Depois, o que não tem feito, o que não tem padecido o Verbo incarnado por amor dessas almas, para remi-las da escravidão do demônio, na qual caíram pelo pecado? Chegou a nada menos do que a dar por elas o seu sangue e a sua vida. Se, em vez de uma só morte, seu Pai lhe tivera exigido mil; se, em vez de ficar três horas na cruz, tivera de ficar nela até o dia do juízo; se afinal tivera de sofrer para salvação de cada um, o que padeceu para salvação de todos os homens juntos, Jesus Cristo não teria hesitado em fazer tanto. Tão grande é o amor que lhe fazem perder tantas almas. — Julgai por aí quão amargo desgosto causam ao Coração de Jesus os escandalosos, que Lhe fazem perder tantas almas, roubam-Lhe e assassinam tantas filhas tão diletas. Diz São Bernardo, que a perseguição que o Senhor sofre da parte daqueles pérfidos algozes é mais cruel do que a que sofreu da parte dos que o crucificaram.
Tendo os filhos de Jacob vendido a José, apresentaram ao pai a túnica deste tingida no sangue de um cabrito, dizendo-lhe: Vide utrum tunica filii tui sit (3) — “Vê se é ou não a túnica do teu filho”. Do mesmo modo, nos podemos figurar que, quando uma pessoa peca, induzida ao pecado por um escandaloso, os demônios apresentam a Deus o vestido daquela pessoa tingida do sangue de Jesus Cristo, isto é, a graça perdida por aquela alma escandalizada. Se Deus pudesse chorar, choraria então mais amargamente do que Jacó, dizendo: Fera pessima devoravit eum — “Uma fera péssima a devorou”.
II. A fim de não afligirmos mais o Coração de Jesus, guardemo-nos, especialmente nestes dias, de darmos ao próximo qualquer escândalo ou mau exemplo, não somente em coisas graves, senão também nas leves. Abstenhamo-nos sobretudo e sempre de toda palavra que possa ofender a bela virtude, lembrando-nos que uma palavra indecente, muito embora dita de gracejo, pode ser causa de mil pecados. — Se no passado tivemos a desgraça de dar, de qualquer modo, ao próximo ocasião de pecado, saibamos que o Coração aflito de Jesus exige de nós uma rigorosa satisfação, reparando ao menos pelo bom exemplo o mal que fizemos.
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(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 257-259)
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