A alma não deve admirar-se por sofrer oposição, mesmo da parte de pessoas de bem. Deve persuardir-se de que esta miséria é uma consequência fatal da estreiteza do espírito humano e do egoísmo inerente ao coração do homem.
Se todos tivessem idéias amplas e elevadas, todos seriam pelo menos tolerantes e respeitariam o modo de ver e de proceder dos outros. Não condenariam tão facilmente as intenções e as atitudes alheias. Ninguém há tão indulgente como Deus para com os erros do espírito, os defeitos do caráter, as extravagâncias do humor, e mesmo para as culpas morais, porque as vistas de Deus são infinitamente largas. Contenta-se com a boa vontade das Suas criaturas; por ela é que forma o Seu juízo.
O homem, limitado por natureza, não procede assim. Vê as aparências, julga pelo exterior, segue as próprias impressões, simpatias ou antipatias, reprova e quer corrigir tudo o que não se conforme com as suas idéias e modo de agir.
Devemos persuadir-se desta verdade: neste mundo, nunca encontraremos, fora do círculo dos que comungam com o nosso ideal, quem esteja disposto a dar-nos a sua aprovação e apoio sem reservas. Enquanto a alma não tiver enraizada esta convicção, não estará livre de penosas desilusões. É preciso conformar-se com esta inclinação da natureza humana. Deus assim o quis, para que a alma só O tenha como ponto de apoio seguro e só confie nEle e nos que por Ele lhe estão unidos.
Uma vez abandonada a Deus definitivamente, a estima dos homens torna-se-lhe indiferente. As suas críticas, violências, zombarias já não têm o poder de abalá-la. Não foi para agradar-lhes nem para capitar-lhes a estima que optou por Deus.
Mesmo que o mundo inteiro se erguesse contra essa alma, em que poderia prejudicá-la? Ela não depende do mundo nem da sua aprovação. Sabe que a opinião dos homens nada vale diante de Deus. Se o universo inteiro se coligasse contra ela, não lhe poderia tirar o mérito de uma única das suas ações. O mundo só é poderoso contra aqueles que o temem. Aqueles que lhe afrontam as ameaças e gritos sabem-no impotente.
É bom repetir às vezes no fundo da alma: pode vir um dia em que serei abandonado pelos que me são caros, incompreendido pelos meus familiares ou colegas e condenado por alguns dos meus amigos. Não temerei essa situação, porque o Senhor me basta. Faço desde já o sacrifício da estima, afeição e confiança dos que estimo e procurarei somente não me afastar do que Deus quer de mim. Quanto mais repelido pelas criaturas, mais me chegarei a Jesus. Só Ele conhece a retidão das minhas intenções e a simplicidade do meu coração.
Este ato, frequentemente renovado na oração, desenvolve na alma um grande desprendimento, uma santa independência de toda a apreciação humana.
Deus, aliás, não deixa a alma indefesa. Quanto mais ela se abandona nEle, mas Ele a toma sob a Sua direção. Quanto menos se justifica diante dos outros, mais Deus Se ocupa da sua defesa e do seu progresso espiritual. Para os Seus desígnios, serve-se dos próprios inimigos. As incompreensões, violências ou astúcias contribuem para pôr em foco a inocência e integridade dessa alma. Basta-lhe entregar-se a Deus, confiar-Lhe os seus cuidados e interesses, limitando-se a amá-Lo, e eis que o céu inteiro se sente obrigado par com ela e se movimenta em sua defesa.
Senhor! O meu proceder nas adversidades e oposições é, pois, bem simples, basta lançar-me nos Vossos braços, confiar-Vos a minha defesa e amar-Vos. Seria mais fácil desaparecer o céu e a terra do que ser confundida uma alma que confia em Vós.
Desta maneira, a atitude da alma interior nunca muda. No tempo da abundância, das consolações, das luzes, da aprovação dos homens, só tem um ato: o dom integral de si mesmo a Jesus. No tempo das trevas, das misérias próprias, das críticas e adversidades, também só tem um mesmo gesto: dar-se a Deus por um ardente ato de amor. Eis todo o seu segredo, toda a sua sabedoria.
(O dom de si, vida de abandono em Deus, pelo Pe. Joseph Schrijvers)
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