terça-feira, 15 de setembro de 2015

Sobre a influência dos pais na vocação dos filhos


De nenhum modo deve a influência dos pais impelir os filhos para o sacerdócio, com a mira apenas nos interesses e vantagens da própria família, e não com os olhos no bem das suas almas. Esses pensam na vida presente, diz o autor da Obra imperfeita, e esquecem a eternidade que se há de seguir. Persuadamo-nos de que, no que respeita à escolha de estado, conforme a palavra de Jesus Cristo, são os próprios pais os inimigos mais temíveis: Cada um terá por inimigos os da sua casa. A isto ajunta: Quem ama o seu pai ou a sua mãe mais do que a mim, não é digno de mim.

    Ó! quantos padres se verão condenados no dia do juízo por terem recebido as santas Ordens, para fazerem a vontade a seus pais! Não se compreende! Se um jovem, movido por uma vocação divina, quer entrar em religião, — que não fazem então os pais, por paixão ou por interesse da família, para o afastarem dum estado a que Deus o chama! Entenda-se bem, um tal procedimento, como ensinam em comum todos os doutores, não pode escusar-se depecado mortal; leia-se o que escrevemos na nossa Teologia moral (l. 4. n. 77). Neste caso, os pais tornam-se duplamente culpados: 1.º, pecam contra a caridade, pelo grande mal que causam àquele a quem Deus chama, pois comete uma falta grave qualquer pessoa, embora estranha, que afasta alguém da vocação religiosa; 2.º, pecam contra o amor paternal, porque os pais que têm a seu cargo a educação de seus filhos, estão obrigados a procurar-lhes a maior vantagem espiritual.
     Há confessores ignorantes que, — aos seus penitentes que querem abraçar o estado religioso, — insinuam que devem nisso obedecer a seus pais, e renunciar à sua vocação, se eles se opuserem a ela. É seguir a doutrina de Lutero que dizia que os filhos pecam, quando entram em religião sem o consentimento de seus pais. Tal doutrina é contradita por todos os Santos Padres e pelo Concílio 10 de Toledo, onde se decidiu que é permitido aos filhos, passados os catorze anos, fazerem-se religiosos, mesmo contra a vontade de seus pais. (Veja-se o Novo Código de Direito Canônico, cân. 555 e 573).
    Sem dúvida, são os filhos obrigados a obedecer a seus pais. em tudo quanto respeita à educação e o governo da casa; mas, quanto à escolha de estado, devem obedecer a Deus, e escolher o estado a que ele os chamar. Quando os pais quiserem fazer-se obedecer também nesse ponto, devem os filhos responder-lhes o mesmo que os apóstolos responderam aos príncipes dos judeus: Vós próprios julgai se é justo, aos olhos de Deus, obedecer antes a vós do que a Deus.
    Ensina expressamente Santo Tomás que na escolha dum estado, não estão os filhos obrigados a obedecer a seus pais e ajunta que, quando se trata da vocação religiosa, os filhos nem mesmo estão obrigados a tomar conselho com os pais, que, ao verem feridos os seus interesses, são antes inimigos do que pais. Como diz S. Bernardo, antes querem ver os filhos condenar-se com eles, do que permitir-lhes que se salvem sem eles. Pelo contrário, se vêem que um filho, fazendo-se padre, pode ser útil à família, — que esforços não fazem então para que se ordene, a torto ou a direito, embora não seja chamado por Deus! E que gritos, que ameaças se o filho, sensível aos remorsos da própria consciência, recusa receber as santas Ordens! Pais bárbaros, e antes homicidas do que pais, vos chamamos com S. Bernardo! Mais uma vez, desgraçados pais e desgraçados filhos! Quantos não havemos de ver no Vale de Josafat que serão condenados por causa da vocação, visto que a salvação de cada um, como acima demonstramos, está dependente da fidelidade em seguir a vocação divina!

Retirado do livro 'A Selva' de Santo Afonso de Ligório

Fonte:
http://paramaiorgloriadedeus.blogspot.com.br/

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