Tire o maior proveito desta Novena de Natal seguindo os passos
para se fazer a Oração Mental proposta por Santo Afonso!
In propria venit, et sui eum non recepernunt – Veio para o que era seu, e os seus não o receberam (Jo 1, 11)
Sumário. A ingratidão desagrada aos homens. Qual deve, pois, ter sido a tristeza de Jesus Menino, ao prever que os seus benefícios seriam pagos pelo mundo com injúrias, traições e tormentos! Mas ai de nós, que por ventura também até hoje temos respondido aos benefícios do Senhor de um modo tão desumano. Ou pelo menos temo-lo amado tão pouco, como se nenhum bem nos tivesse feito, nem sofrido coisa alguma por nós. Quereremos ser tão ingratos sempre?
I. Pelos dias do Santo Natal, São Francisco de Assis andava pelos caminhos e bosques chorando e suspirando com gemidos inconsoláveis. Perguntando pela razão de tanto sofrer respondeu:
Como não chorar, vendo que o amor não é amado? Vejo um Deus como que perdido de amor ao homem, e o homem tão ingrato para com esse Deus!
Ora, se a ingratidão dos homens afligia tanto o coração de São Francisco, quanto mais não terá afligido o Coração de Jesus Cristo?
Apenas concebido no seio de Maria, Jesus viu a ingratidão despiedada que receberia da parte dos homens. Baixara do céu para acender o fogo do divino amor; somente este desejo fizera-o descer sobre a terra para ali sofrer um abismo de dores e ignomínias: Ignem veni mittere in terram (1) – Eu vim trazer o fogo à terra. E em seguida viu um abismo de pecados que os homens haviam de cometer, depois de presenicarem tantos rasgos de seu amor. Foi isso, no pensar de São Bernardino de Sena, o que o fez sofrer dores infinitas: Et ideo infinite dolebat. Mesmo para nós é insuportável vermos uma pessoa tratada por outra com ingratidão, e muita vezes isto aflige muito mais a alma, do que qualquer dor aflige o corpo. Qual não deve, pois, ter sido a dor que nossa ingratidão causou a Jesus, nosso Deus, quando viu que os seus benefícios e o seu amor lhe seriam retribuídos por nós com desgostos e injúrias? Et posuerunt adversum me mala pro bonis, et odium pro dilectione (2) – Retribuíram-me o bem com o mal, e o meu amor com ódio.
Parece que também hoje em dia Jesus Cristo se queixa: Tamquam extraneus factus sum fratribus meis (3) – Fiquei como que um estranho a meus irmãos. Porquanto vê que de muitos não é amado, nem conhecido, como se nenhum bem lhes tivesse feito, e nada por amor deles tivesse sofrido. Ó Deus, que caso fazem também presentemente tantos cristãos do amor de Jesus Cristo?
II. Apareceu certo dia o Redentor ao Bem-aventurado Henrique Suso, sob a forma de um peregrino que andava de porta em porta, a pedir pousada, mas todos o repeliam com injúrias e ultrajes. Ai! quantos homens se parecem com aqueles de que fala Jó, dizendo: Diziam a Deus: Retira-te de nós… sendo ele quem cumulou de bens as suas casas (4). Em outro tempo nós também nos temos unido àqueles ingratos; mas quereremos continuar do mesmo modo? Não, porque não merece tal o Menino amável que baixou do céu para padecer e morrer por nós, e assim fazer-se amar de nós.
Meu amado Jesus, será verdade que Vós baixastes do céu para Vos fazerdes amar de mim, que por meu amor viestes abraçar uma vida de trabalhos e a morte de cruz, afim de que eu Vos faça boa acolhida em meu coração, eu que tive a audácia de Vos repelir tantas vezes de mim, dizendo: Recede a me, Domine – Afasta-te de mim, Senhor; não Vos quero? Ó meu Deus, se não fosseis a bondade infinita e não tivesseis dado a vida para me perdoardes, não me animaria a peidr-Vos perdão. Mas ouço que vós mesmo me ofereceis a paz: Convertimini ad me, ait Dominus, et convertar ad vos (5) – Convertei-vos a mim, diz o Senhor, e eu me converterei a vós. Vós mesmo, ó Jesus, a quem tenho ofendido, quereis ser o meu advogado: Ipse est propitiatio pro peccatis nostris (6) – Ele é a propiciação pelos nossos pecados. Não Vos quero fazer nova injúria desconfiando da vossa misericórdia. Pesa-me de toda a minha alma de Vos ter desprezado, ó Bem supremo; pelo sangue que derramastes por mim, recebei-me em vossa graça.
Pater, non sum dignus vocari filius tuus (7) – Meu Pai e meu Redentor, não sou mais digno de ser vosso Filho, depois de ter renunciado tantas vezes ao vosso amor; mas fazei-me digno com os vossos merecimentos. Graças Vos dou, meu Pai, graças Vos dou e Vos amo. Ah, só a lembrança da paciência com que me tendes suportado tantos anos, e das graças que me tendes dispensado, depois de tantas injúrias que vos causei, deveria fazer-me viver sempre abrasado em vosso amor. Vinde, pois, meu Jesus, não quero mais repulsar-Vos, vinde morar em meu pobre coração. Amo-VOs e quero amar-Vos sempre. Abrasai-me sempre mais, lembrando-me o amor que me mostrastes.
Minha Rainha e Mãe, Maria, ajudai-me, rogai a Jesus por mim; fazei com que, no tempo de vida qeu ainda me resta, me mostre grato a Deus, que me amou tanto, ainda depois de eu o ter ofendido tão gravemente.
Referências:
(1) Lc 12, 49
(2) Sl 108, 5
(3) Sl 68, 9
(4) Jó 22, 17
(5) Zc 1, 3
(6) Jo 2, 2
(7) Lc 15, 21
OBS: Santo Afonso indulgenciou esta Novena da seguinte forma: para cada dia da Novena, recebemos Indulgência de 300 dias. Para o dia do Natal ou num dia da Oitava, recebemos Indulgência Plenária se fizermos e cumprirmos as obras prescritas da Confissão e da Comunhão.
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(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 68-71)
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