Sumário. Durante a sua estada no Egito, a sagrada Família se nos mostra modelo perfeitíssimo de uma família cristã e de uma comunidade religiosa. Quão bem ordenadas estavam todas as ocupações dessas santas pessoas, quão bem dividido o tempo entre o trabalho e a oração! Com o seu trabalho José ganha o pão para si e para os outros; Maria cuida principalmente de seu Filho; e Jesus começa a prestar a seus pais os primeiros leves serviços. Lancemos um olhar sobre nós mesmos e examinemos como temos imitado esses grandes modelos.
I. Jesus quis passar a sua infância no Egito, a fim de levar uma vida mais dura e desprezada. Segundo a opinião de Santo Anselmo e de outros escritores, a sagrada Família morou em Heliópolis. Contemplemos, com São Boaventura, a vida que Jesus levou no Egito, durante os sete anos que, conforme à revelação feita a Santa Maria Madalena de Pazzi, ali passou. A casa é muito pobre, porque São José só pode pagar um aluguel muito baixo; pobre é a cama, pobre a alimentação, pobre, em uma palavra, é toda a sua vida, porque, com o trabalho de suas mãos, só conseguem ganhar o necessário de dia em dia, e vivem num país onde são desconhecidos e desprezados, sem parentes nem amigos.
A sagrada Família vive, pois, em grande pobreza, mas como são bem ordenadas as ocupações desses três moradores! O santo Menino não fala com a boca, mas fala continuamente e eloqüentemente com o coração a seu Pai celestial, oferecendo-Lhe todos os seus padecimentos e todos os instantes de sua vida para nossa salvação. Maria tampouco fala, mas, vendo o seu caro Filhinho, contempla o amor divino e a graça que lhe fez escolhendo-a para sua Mãe. José trabalha igualmente em silêncio, mas vendo o divino Menino agradece-Lhe por tê-lo escolhido para companheiro e guarda de sua vida.
Foi naquela casa que Maria desabituou o menino Jesus de alimentar-se só com o leite e começou a alimentá-Lo com suas próprias mãos. Põe o Filho no colo, toma da tigelinha um pouco de pão amolecido em água e põe-Lho na sagrada boca. Naquela casa faz Maria para seu Filhinho o primeiro vestido e chegado o tempo de Lhe tirar as faixas, começa a vesti-Lo. Naquela mesma casa ainda começa Jesus a dar os primeiros passos e a falar. Começa ali a fazer o ofício de aprendiz, ocupando-se com os pequenos serviços que pode prestar uma criança.
Ó desmame! Ó vestidinho! Ó primeiros passos! Ó palavras balbuciadas! Ó pequenos serviços de Jesus Menino! Vós demasiadamente feris e abrasais os corações daqueles que amam Jesus e vos contemplam! Um Deus a andar vacilando e caindo! Um Deus a balbuciar! Um Deus feito tão débil, que não pode ocupar-se senão em pequenas coisinhas de casa, que não pode levantar um pão cujo peso excede as forças de uma criança. Ó santa fé, ilumina-nos a fim de que amemos um Senhor tão bom, que por nosso amor se sujeitou a tantas misérias.
II. Dizem que, quando Jesus entrou no Egito, caíram por terra todos os ídolos daquele povo. Roguemos a Deus que nos faça amar Jesus de todo o coração, porque, quando o amor de Jesus entra numa alma, caem todos os ídolos de afetos terrestres.
Ó Menino santo, que viveis nessa terra de bárbaros, pobre, desconhecido e desprezado, eu Vos reconheço por meu Deus e Salvador, e Vos dou graças por todas as humilhações e dores que sofrestes no Egito por meu amor. Com essa vossa vida ensinastes-me a viver como peregrino nesta terra, fazendo-me compreender que a minha pátria não é este mundo, senão o paraíso, que Vós viestes adquirir-me com a vossa morte. Ah, Jesus meu! Tenho pensado no que fizestes e padecestes por meu amor. Quando me lembro que Vós, ó Filho de Deus, tivestes nesta terra uma vida tão atribulada, pobre e desprezada, como é possível que eu ande à procura de prazeres e bens terrestres?
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(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 164-167)
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