
Sumário. É certo que fomos todos condenados à morte. Todos nascemos com a corda ao pescoço, e a cada passo que damos, aproximamo-nos mais do patíbulo. Que loucura, pois, a nossa, sabermos que havemos de morrer, crermos que do momento da morte depende uma eternidade de gozos ou de penas, e não pensarmos no ajuste das contas e nos meios para ter uma boa morte! Compadecemo-nos dos que morrem subitamente. Porque é, pois, que nos expomos ao risco de nos suceder a mesma desgraça? Quem sabe se este ano não é o último da nossa vida?… Quem sabe se ainda amanheceremos?
I. É certo que fomos todos condenados à morte. Todos nascemos, diz São Cipriano, com a corda ao pescoço e, a cada passo que damos, nos aproximamos mais da morte. Meu irmão, assim como foste inscrito um dia no livro dos batismos, assim serás inscrito um dia no livro dos mortos. Assim como dizes hoje dos teus antepassados: meu falecido pai, tio ou irmão, assim dirão de ti os que vierem depois. Assim como ouviste muitas vezes dobrar os sinos pela morte dos outros, assim outros os ouvirão dobrar pela tua morte.
Que dirias, se visses um condenado à morte caminhar para o suplício galhofando, rindo, olhando para toda a parte e pensando ainda em comédias, festins e divertimentos? E tu, não caminhas neste momento para a morte? E em que pensas? Vê nessa cova teus amigos e parentes, a quem já feriu a sentença. Que horror se apodera dos condenados quando veem os seus companheiros já mortos e pendentes da forca! Atenta nesses cadáveres, cada um dos quais te diz: Mihi heri et tibi hodie (1) – “Ontem a mim, hoje a ti.” É isto o que te dizem ainda os retratos de teus parentes já mortos, os seus escritos, as casas, os leitos, as roupas que deixaram.
Haverá loucura maior do que saber que se há de morrer e que depois da morte nos espera uma eternidade de alegrias ou uma eternidade de penas; saber que do momento da morte depende um futuro eternamente feliz ou eternamente infeliz: e não pensar em ajustar as contas e em empregar todos os meios para te ruma boa morte: compadecemo-nos dos que morrem subitamente e não se acham preparados para a morte; como é então que não cuidamos em estar preparados, podendo-nos acontecer o mesmo? – Mas cedo ou tarde, prevista ou imprevistamente, quer pensemos nisso quer não, devemos morrer; e a todas as horas, a todos os instantes nos vamos aproximando da nossa forca, quer dizer, da última doença que nos deve fazer sair deste mundo.
II. Em cada século, as casas, as praças e as cidades enchem-se de novos habitantes, e os que precederam são levados e enterrados nos túmulos. Assim como para estes passaram os dias da vida, da mesma maneira chegará o tempo em que nem eu, nem vós, nem nenhum dos que vivem atualmente, existirá na terra. Então estaremos todos na eternidade, que será para nós ou um eterno dia de delícias, ou uma eterna noite de tormentos. Não há meio termo; é certo, é de fé que uma das duas sortes nos espera.
Referências:
(1) Eclo 38, 23
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(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo III: Desde a Décima Segunda Semana depois de Pentecostes até o fim do ano eclesiástico. Friburgo: Herder & Cia, 1922, p. 63-66)
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