4º Dia da Novena ao Sagrado Coração de Jesus
Ecce, sto ad ostium et pulso: si quis… aperuerit mihi ianuam, intrabo ad illum – “Eis que estou à porta e bato; se alguém… me abrir a porta, entrarei em sua casa” (Ap 3, 20)
Sumário. Jesus não precisa de nós; com ou sem o nosso amor é Ele igualmente feliz, rico e poderoso. Mas, porque nos ama, acha as suas delícias em conversar com os filhos dos homens e deseja tanto ser de nós amado, como se o homem lhe fosse Deus e a sua felicidade dependesse da do homem. Que monstruosa seria, pois, a nossa ingratidão, se não procurássemos satisfazer os desejos desse Coração amabilíssimo! Que contas teríamos de lhe dar um dia no tribunal divino!
I. Jesus não precisa de nós; com ou sem o nosso amor é Ele igualmente feliz, rico e poderoso. Todavia, diz Santo Tomás, porque Jesus Cristo nos ama, Ele deseja tanto o nosso amor, como se o homem lhe fosse Deus e a sua felicidade dependesse da do homem. É o que pasmava ao santo Jó que dizia: Quid est homo, quia magnificas eum: aut quid apponis erga eum cor tuum? (1) – “Que é o homem para o engrandeceres? E porque pões sobre ele o teu coração?” Como? Um Deus desejar e pedir com tamanha instância o amor de um verme!
Já seria grande favor, se Deus nos tivesse permitido amá-Lo. Se um vassalo dissesse a seu monarca: Senhor, eu vos amo; seria tido por um sujeito presunçoso. Mas que se havia de dizer, se o rei ordenasse ao vassalo: eu quero que me ames: não se abaixam a tanto os reis da terra; mas Jesus Cristo, o Rei do céu, Ele nos pede com todo o empenho o nosso amor: Diliges Dominum Deum tuum ex toto corde tuo (2) – “Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração”. Com toda a insistência nos pede o coração: Praebe, fili mi, cor tuum mihi (3) – “Meu filho, dá-me teu coração”. – Mesmo quando se vê expulso de uma alma, Jesus não se afasta, fica à porta do coração, chama e bate para entrar: Sto ad ostium et pulso – “Estou à porta e bato”: roga à alma que lhe abra, chamando-a sua irmã e esposa: Aperi mihi, soror mea, sponsa (4) – “Abre-me, minha irmã e esposa”. Numa palavra, Jesus acha as suas delícias em ser amado de nós e fica todo consolado quando uma alma lhe diz e frequentemente repete: Jesus, meu Deus, eu Vos amo sobre todas as coisas.
Tudo isso é efeito do grande amor que Jesus nos tem. Quem ama, deseja necessariamente ser amado. O coração pede o coração; amor busca amor. Ad quid diligit Deus, nisi ut ametur? – “Para que é que Deus ama, senão para ser amado?” pergunta São Bernardo; e antes dele o próprio Deus dissera: “Ó Israel, que é que o Senhor teu Deus pede de ti, senão que o temas, andes nos seus caminhos e O ames e sirvas de todo o teu coração e de toda a tua alma?” (5)
II. Porque Jesus Cristo deseja que o amemos de todas as nossas forças, nos diz que Ele é o Pastor, que, tendo achado a ovelha perdida, convida todos a congratularem-se com Ele: Congratulamini mihi, quia inveni ovem meam quae perierat (6). Assegura-nos que é aquele pai que, quando o filho pródigo se prostra a seus pés, não somente lhe perdoa, mas o abraça com ternura (7). Diz-nos que, quem não o ama, fica entregue à morte: Qui non diligit, manet in morte (8). Ao contrário, estreita a si ao que O ama e toma posse dele: Qui manet in caritate, in Deo manet, et Deus in eo (9) – “Aquele que permanece na caridade, permanece em Deus e Deus nele”. E tantos pedidos, tantas instâncias, tantas ameaças e promessas, não nos moverão a amar um Deus que tamanho desejo tem de ser amado por nós?
Meu amado Redentor, assim Vos direi com Santo Agostinho, Vós me ordenais que Vos ame, e se Vos não queira amar, me ameaçais o inferno; mas que inferno me poderia ser mais horrível, que desgraça mais triste do que ver-me privado do vosso amor? Se, pois, quereis, aterrar-me, ameaçai-me que terei de viver sem Vos amar: só esta ameaça me inspira mais medo que mil infernos. Meu Deus, se, no meio das chamas do inferno, os réprobos ainda Vos pudessem mais amar, o inferno se lhes transformaria em paraíso; e se, ao contrário, os Bem-aventurados do céu não Vos pudessem mais amar, o paraíso lhes seria um inferno.
Reconheço, ó meu amado Senhor, que pelos meus pecadores mereceria ser abandonado pela vossa graça, e portanto condenado a não poder mais amar-Vos; mas ouço que ainda me ordenais que Vos ame, e sinto em mim um grande desejo de Vos amar. Este desejo já é um dom de vossa graça; Vós mesmo m´o inspirais; dai-me, portanto, a força para o realizar. Fazei que doravante eu Vos diga com todas as veras e de todo o coração, e o diga sempre: Amo-Vos, meu Deus, amo-Vos, amo-Vos – Vós desejais meu amor, eu desejo o vosso. Esquecei-Vos, ó meu Jesus, dos desgostos que no passado Vos causei; amemo-nos sempre; eu Vos não deixarei e Vós tampouco me deixareis. Vós me amareis sempre e eu sempre Vos amarei. Meu querido Salvador, vossos méritos são a minha esperança. Por piedade, fazei que sempre e muito Vos ame e Vos ame um pecador que muito Vos ofendeu. – Virgem imaculada, Maria, socorrei-me, rogai a Jesus por mim.
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(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo II: Desde o Domingo da Páscoa até a Undécima Semana depois de Pentecostes inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 157-160)
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