
Diz ainda:
Tollat, tome: de pouco serve carregá-la forçadamente; todos os pecadores a carregam, mas sem merecimento. Para a carregarmos com merecimento, devemos abraçá-la de boa vontade.
— Crucem, a cruz: sob o nome de cruz vem toda a tribulação, que por Jesus Cristo é chamada cruz, a fim de nô-la tornar doce, com pensar que em uma cruz ele morreu por nosso amor.
Jesus diz: suam, a sua cruz. Alguns, ao receberem qualquer consolação espiritual, se oferecem para sofrer o que tem sofrido os mártires: acúleos, unhas de ferro e lâminas candentes; mas, logo em seguida não sabem sofrer alguma dor de cabeça, uma falta de atenção da parte de um amigo, o enfado de um parente. Irmão meu, Deus não quer de ti que sofras nem cavaletes, nem unhas de ferro, nem lâminas candentes; mas quer que sofras com paciência essa dor, esse desprezo, esse aborrecimento. Tal outro quisera ir a um deserto para sofrer; quisera praticar grandes penitências; entretanto não sabe suportar um seu superior, um seu companheiro de ofício. Deus, porém, quer que ele carregue a cruz que lhe é dada para carregar, e não aquela que ele mesmo escolheu.
Ainda diz: quotidie, cada dia. Alguns abraçam a cruz no princípio, quando ela se apresenta; mas quando dura, dizem: Não posso mais. Todavia, Deus quer que continues a carregá-la com paciência, muito embora fosse preciso carregá-la sem cessar até à morte. Eis aí portanto em que consiste a salvação e a perfeição; consiste em cumprir estas três palavras: Abneget, recusemos ao amor próprio o que não lhe convém. Tollat, abracemos a cruz que Deus nos envia. Sequatur, sigamos as pegadas de Jesus Cristo até à morte.
II. Devemo-nos, pois, persuadir de que Deus nos conserva no mundo, para que carreguemos as cruzes que nos envia; e é isto o que faz a nossa vida meritória. Porque nosso Salvador nos ama, veio sobre esta terra, não para gozar, mas para sofrer, a fim de que lhe sigamos as pegadas: Christus passus est pro nobis, vobis relinquens exemplum ut sequamini vestigia eius — “Cristo padeceu por nós, deixando-nos exemplo, para que sigais as suas pisadas (1). Contemplemo-lo, a Ele que vai adiante com a sua cruz, a fim de traçar-nos o caminho pelo qual devemos segui-Lo, se nos quisermos salvar. Oh! Que grande remédio, dizer a Jesus Cristo em cada aflição: Senhor, Vós quereis que eu carregue esta cruz; aceito-a e quero sofrê-la até quando quiserdes. Assim, e muito mais ainda, o merece Jesus Cristo, que, para nos livrar do inferno, escolheu uma vida de trabalho e uma morte de dor.
Referências:
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(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 20-23)
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