sábado, 9 de abril de 2016

A MORAL SEM DEUS

A moral é jóia tão indispensável à humanidade, que todos consideram sua defesa como absolutamente necessária. Por mais errados que sejam os conceitos de muitos acerca da religião, todos proclamam unanimemente a necessidade de proteger os bons costumes e de salvá-los, em prol da humanidade.
Mas esta é justamente a pergunta: pode-se falar de moral sem religião? Pode alguém ter bons costumes sem ter fé? Quando se instala a bússola num navio, procura-se isolá-la, o melhor possível, da influência de correntes magnéticas que poderiam provir da couraça do casco. A razão é a bússola da vida humana; correntes estranhas, oriundas do corpo — a inclinação para o mal — desviam-na facilmente e desgovernam nossa vida, se ela não estiver orientada para determinado ponto, muito acima de toda corrente de egoísmo e da ilusão própria. Se os homens, e não Deus, tivessem determinado o que é moral ou imoral, andariam muito mal parados a respeito da moralidade. Pois o que eu chamo pecado, com o mesmo direito outro poderia chamar virtude.
Portanto, quem não crê no Supremo Legislador, superior à natureza, quem não crê numa vida sobrenatural, depois da terrena não pode falar em moral. Em primeiro lugar deve o homem saber que é a criatura humana e quem é Deus; só então compreenderá o que deve fazer ou omitir.
Uma vida morigerada exige luta; não pode ser diversamente. Um colegial se exprimia assim: “Por que é tão difícil ser bom e tão fácil ser mau?” Não notaste ainda, e repetidas vezes, esse antagonismo trágico em teu coração? A razão reconhece o bem e o deseja; nossa natureza decaída, pelo contrário, arrasta-nos ao mal…
No entanto, só poderei suportar os múltiplos sacrifícios e a mortificação de mim mesmo, que, uma vida de caráter, exige diariamente, se minhas aspirações se apegarem ao Sumo Bem, a Deus, para Quem vivo, de Quem tudo recebo, e que, somente Ele, pode conceder à minha vontade a necessária inabalável fortaleza.
Um grande pensador grego tinha como pensamento favorito, que a alma humana provém de um mundo totalmente perfeito; daí o sentirmos um profundo descontentamento conosco mesmos, um como aguilhão no coração, sempre que agimos mal, embora ninguém tivesse presenciado nossa falta. E a alma só é feliz quando faz alguma coisa que a reabilite e lhe recorde a pátria de onde desceu.
Voltaire convidou um dia seus amigos incrédulos, D’Alembert e Diderot, para um jantar. À mesa, os convivas começaram a falar das costureiras frivolidades. Voltaire atalha a conversa: “Peço-lhes que não falem assim diante dos criados. Esperem que se tenham retirado, pois se ouvirem tais idéias e as puserem em prática, nossa vida correrá perigo”. Haverá pois moral sem religião?
Napoleão I proibiu a leitura de livros antirreligiosos e justificou seu ato, dizendo: “Não me sinto assaz forte para governar um povo que lê Voltaire e Rousseau.”
Estando Heine defronte a antiga e maravilhosa catedral gótica de Antuérpia, exclamou, tomado de admiração: “Sim, naqueles tempos tinham os homens ainda dogmas. Nós temos somente opiniões. Com opiniões não se podem construir tais monumentos!” E ele tinha razão. Mas o mesmo podemos dizer das maravilhas arquitetônicas da vida moral. O caráter também é um monumento, cujas colunas, alçadas para o céu, procuram elevar a alma acima das vias tortuosas do egoísmo, das paixões e das inclinações más. Contudo, a construção dessa basílica avança devagar e nunca se pode garantir sem os alicerces graníticos de sólida fé em Deus.
É verdade que se podem criar, teoricamente, sistemas éticos sem base religiosa. O essencial todavia, é a força que os faz viver. É fácil proclamar um sistema moral, difícil é pô-lo em prática sem base sólida.
É possível que antes do Cristianismo houvesse homens proeminentes, caracteres firmes, mas desde que Cristo nos foi exemplo da vida perfeita, não pode ser um caráter no sentido estrito, senão aquele que cumprir seu primeiro dever, o de submeter-se a Deus.
Por isso escreve mui acertadamente Racine a seu filho: “Quero crer que os teus esforços para te tornares um cavalheiro, não te fazem esquecer de que somente poderá ser gentleman aquele que cumprir seus deveres para com Deus.”
Pode alguém ser morigerado, se não acreditar no além-túmulo?
Ouve este diálogo, travado entre duas estrelas:
— “Olha, irmã, olha a terra. Que vês ali?” — perguntou a primeira.
— “Denso nevoeiro e nuvens que se acumulam ao redor dela.”
Passam cem mil anos.
A primeira estrela interroga novamente: “Irmã, olha de novo para a terra. Que vês agora?”
— “Uma infinidade de formiguinhas bípedes que se agitam sobre ela.”
— “São os homens.”
Mais uma vez escoam cem mil anos.
— “E agora que enxergas sobre a terra?”
— “Nada se move. Gelo e neve cobrem tudo…”
Até aqui o diálogo dos astros. Não sentes, caro jovem, o bafo gélido e destruidor da caducidade da matéria? Se a vida humana é transitória, se não há uma vida eterna, quem nos emprestará forças para perseverar na honradez, no caráter, na moralidade, também quando tivermos de sacrificar para isso o nosso progresso material, o êxito, o bem-estar, os apetites sensuais? Sim, para uma vida imortal estamos prontos a sacrificar os interesses temporais. Quem quisera, porém, trocar os bens passageiros por outros igualmente transitórios?
A  Religião e a Juventude – Mons. Tihamer Toth

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