quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Excelência da Santíssima Eucaristia


“Dize-me, meu irmão, que é que o Senhor podia fazer mais a fim de se fazer amar de nós?”


Quid est bonum eius et quid pulchrum eius, nisi frumentum electorum et vinum germinans virgines – “Qual é o bem dele e qual é a sua formosura senão o pão dos escolhidos e o vinho que gera virgens?” (Zc 9, 17)
Sumário. O mais digno e excelente entre todos os sacramentos é o Santíssimo Sacramento do Altar, porque os demais sacramentos contém os dons de Deus, mas este contém o próprio Deus. Por isso não há outro meio mais eficaz para conduzir uma alma à perfeição do que a santa comunhão, que a une a Jesus Cristo e a faz uma só coisa com Ele. Dize-me, meu irmão, que é que o Senhor podia fazer mais a fim de se fazer amar de nós? Todavia não somente O temos amado pouco até hoje, mas ainda Lhe temos sido ingratos.
I. O mais nobre e excelente entre todos os sacramentos é o Santíssimo Sacramento do Altar. Os demais sacramentos contém os dons de Deus, mas o sacramento da Eucaristia contém o próprio Deus. Afirma o Doutor Angélico, que os outros sacramentos foram instituídos por Jesus Cristo a fim de preparar o homem para a recepção ou administração da Santíssima Eucaristia, a qual, na frase do Santo, é a consumação da vida espiritual, porquanto deste Sacramento deriva toda a perfeição de nossas almas.
Segundo o ensino dos mestres espirituais, toda a perfeição de uma alma consiste na união com Deus; pois bem, não há melhor meio para nos unir mais com Deus, do que a santa comunhão, pela qual a alma se forma uma só coisa com Jesus Cristo, como ele mesmo disse: Qui manducat meam carnem… in me manet, et ego in eo (1) – “O que come a minha carne, fica em mim e eu nele”. É belíssima a comparação que a este respeito faz São Cirilo de Alexandria. Diz ele que na santa comunhão o Senhor se une à nossa alma assim como se unem dois pedaços de cera derretida. — Foi exatamente para este fim que nosso Salvador instituiu o Santíssimo Sacramento em forma de alimento; para nos dar a entender que, assim como o alimento se transforma em nosso sangue, assim este pão celeste se torna uma coisa conosco.
Há, porém, esta diferença entre o alimento terrestre e a Santíssima Eucaristia: aquele se transforma em nossa substância, ao passo que na recepção desta, nós somos transformados na natureza de Jesus Cristo, segundo esta palavra que o abade Ruperto lhe põe na boca: Tomai-me por vosso alimento e sereis pela minha graça o que Eu sou por natureza. O Senhor deu a entender isso também a Santo Agostinho, quando lhe disse: Non ego in te, sed tu mutaberis in me — “Não sou eu que serei transformado em ti, mas tu serás transformado em mim”. — Ó prodígio de amor! O Deus tão poderoso, que tem o céu por seu trono, a terra por escabelo, os exércitos dos anjos por ministros, as estrelas por coroa, esse Deus tão grande, tão imenso, que nem os céus podem conter em seus vastos espaços, esse Deus se tornou nosso sustento para nos fazer participar de sua natureza divina!
II. Quid est quod debui ultra facere vineae meae, et non feci? (2) — “Que coisa há que eu devesse ainda fazer à minha vinha, que não lhe tenha feito?”. Ó minha alma, ouve o que te diz teu Deus: Que devia Eu fazer por ti e não o tenho feito: por teu amor Eu me fiz homem; de Senhor me fiz escravo; humilhei-me até nascer numa gruta, como um verme; cheguei mesmo a morrer por ti, e a morrer sobre um madeiro infame. Parecia, pois, que Eu não podia ir mais longe; mas por teu amor ainda excogitei e efetuei mais. Depois da minha morte, Eu me quis deixar ficar contigo no Santíssimo Sacramento. Dize-me, que é que devia fazer mais para cativar o teu amor? Quid est quod debui ultra facere?
Ó meu Senhor e meu Redentor, tendes razão: que Vos poderei responder? Não sei que dizer. Foi excessiva a vossa bondade para comigo, excessiva foi a minha ingratidão para convosco. Cheio de admiração pela vossa imensa bondade, e envergonhado à vista de minha ingratidão, me prostro a vossos pés e Vos digo: Meu Jesus, compadecei-Vos de mim, que paguei o vosso amor com tamanha ingratidão. Tomai vingança, assim Vos digo, tomai vingança de mim e castigai-me; mas não me castigueis desamparando-me; castigai-me e mudai-me. — Ó Senhor, que podeis esperar de mim, se Vós mesmo não o fizerdes? Nada posso fazer, senão dar-Vos o meu pobre coração, a fim de que façais dele o que for de vossa vontade. Eis que Vô-lo dou todo inteiro, Vô-lo consagro, Vô-lo sacrifico. Possui-o para sempre; não o quero mais. Se o quiserdes amar, achareis também o meio para o guardar. Peço-Vos que não o deixeis mais em minhas mãos; aliás tornarei a Vô-lo roubar.
Ó Deus amabilíssimo, ó amor infinito, já que me obrigastes tanto a amar-Vos, peço-Vos: fazei com que eu Vos ame, fazei com que eu Vos ame. Vós, que tão grande milagre fizestes neste Sacramento para entrardes em meu coração, fazei mais este: fazei que eu seja todo vosso, mas todo, todo, todo, sem partilha, sem reserva, de sorte que eu possa dizer nesta vida e na eternidade, que Vós sois o único Senhor de meu coração e a minha única riqueza: Deus cordis mei et pars mea, Deus in aeternum (3). — Ó Maria Santíssima, mãe e esperança minha, ajudai-me e serei certamente atendido.
Referências:
(1) Jo 6, 57
(2) Is 5, 4
(3) Sl 72, 26


(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo III: Desde a Décima Segunda Semana depois de Pentecostes até o fim do ano eclesiástico. Friburgo: Herder & Cia, 1922, p. 253-256)

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